Cerveja, qual a temperatura ideal?

“Cerveja é tudo igual o que importa é está gelada”. Talvez esse seja o mantra mais ecoado pelas mesas de bares Brasil a fora. Crescemos ouvindo isso de nossos avós, pais e das grandes cervejarias. Escutamos tantas vezes que tal ideia acabou se tornando parte do folclore cervejeiro brasileiro, virando uma espécie de dogma para consumidores da bebida. Muita gente não sabe, mas o universo das cervejas vai além das “louras geladas”: são cerca de 120 estilos de cerveja, cada um com suas características e propostas diferentes, por isso não seria justo tratá-las da mesma maneira, e isso vale também para a temperatura de consumo.

Quer dizer que eu não posso consumir uma cerveja estupidamente gelada? Poder pode, mas em alguns casos você estará jogando no lixo todo o prazer gustativo que aquela cerveja gostaria de te oferecer. Isso acontece devido a alguns efeitos colaterais que uma temperatura muito baixa causa na cerveja. Um deles é a não formação da espuma, o que irá diminuir o aroma da cerveja. Isto porque os aromas são percebidos por causa de substâncias voláteis que evaporam junto com o gás. Quanto mais gelada, menos espuma a cerveja forma, ou seja, menos evaporação acontece e menos aroma será notado. Consequentemente, menos sabor será percebido, afinal o gosto que sentimos é uma parceria entre nariz e boca… É tanto que quando não queremos sentir o sabor de um remédio ruim, o que fazemos? Tampamos nosso nariz.

Outro efeito que acontece é uma espécie de “tilt” que sua língua irá sofrer. As papilas gustativas irão adormecer e não irão captar os sabores da maneira adequada. Ou seja, você pouco aproveitará do real sabor da cerveja. É por esse motivo que descartamos aquela cerveja que estava tão boa gelada, mas que após alguns minutos esquentou na nossa mão e ficou intragável. Isso acontece por que começamos a perceber o sabor verdadeiro daquela cerveja, que na maioria dos casos foi feita apenas para refrescar sem maiores preocupações com o sabor. Eu até costumo dizer que quanto pior a cerveja, mais gelada ela deve ser consumida.

Mas como vou saber qual a temperatura para tantos estilos de cerveja? Neste caso vale seguir algumas regrinhas que não são 100% absolutas, mas que irão funcionar na maioria dos casos. A primeira é degustar cervejas mais claras ou menos alcoólicas em temperaturas mais baixas. Já as cervejas mais escuras ou mais alcóolicas, temperaturas mais elevadas, para melhor percepção dos seus aromas e sabores. A segunda é tentar se orientar pelo percentual de álcool, pois na maioria dos casos a temperatura ideal estará em até +3°C do teor alcoólico. Caso ainda bata algum tipo de insegurança, uma boa dica é procurar consumir sempre às temperaturas entre 4° e 10°C, tentando achar um ponto de intermédio no qual a bebida te agrade e satisfaça.

Mas se você deseja algo mais específico, vale buscar ajuda em alguns guias de temperatura por estilos. Coloquei abaixo um resumo com os principais

Estupidamente geladas (0-4ºC) – Aquelas cervejas cuja proposta é apenas refrescar, sem maiores compromissos com o sabor. Indicado para cervejas sem álcool e a maioria das “pilsens brasileiras”.

Bem geladas (4-7ºC) – Hefeweizen, Pilsner, Fruit Beer, Berliner Weisse, Witbier, American Pale Ale, Amber Ale, American Dark Lager e algumas Lambics de fruta e Gueuzes.

Geladas (8-12ºC) – Brown Ale, India Pale Ale, Stout, Porter, Vienna, Schwarzbier, Smoked, Altbier, Dubbel, Tripel, Saison.

Temperatura de adega (12-14ºC) – Bière de Garde, Baltic Porter, Belgian Strong Ale, Weizen Bock, Bock, Scottish Ale, Barley Wine, Quadrupel, Imperial Stout, Imperial/Double IPA, Doppelbock, Eisbock.

Vale lembrar mais uma vez que sempre existirão cervejas que irão na contramão dessas dicas e orientações, e que além disso nada irá superar o gosto pessoal. Gelada ou não, o que vale é que a cerveja te satisfaça.

João Filho
Beer Sommelier formado pela Science of Beer.
Responsável pelo blog Cervas Clube
Nas horas vagas Professor e Publicitário.
Colunista do Portal Sabores